Uma apaixonante e esplendorosa terra, um magnífico povo! Será brilhante seu futuro, construído por todos os que têm Angola no coração, que nela ou na diáspora trabalham e com amor criam suas famílias.
Quinta-feira, 7 de Janeiro de 2021
ainda sobre o silenciamento
"Identificamos um sistema de significado, dominante, no qual, durante décadas, a violência da Guerra Colonial foi ostensivamente apagada, silenciada e empurrada para o esquecimento.
Este sistema de significado é aquele que se concerta com as representações míticas sobre a identidade portuguesa, nomeadamente a ideia, ainda vigente, de Portugal como uma potência colonial não violenta ou como um país de brandos costumes."
"(...) centramo-nos no contexto português para analisar a persistência de uma construção colonial nos próprios mecanismos que fazem da violência colonial algo suficientemente longínquo ou insignificante para que se trivialize ou denegue."
Paradoxalmente (ou não), "O silenciamento da Guerra Colonial portuguesa (1961-1974) constitui um dos elementos mais estruturantes da reconstrução democrática e pós-imperial da sociedade portuguesa."
in "A violência colonial no Portugal democrático: memórias, corpos e silenciamentos", de Bruno Sena Martins - CesContexto Nº13 Abril de 2016 Debates / Centro de Estudos Sociais
Este, é um silenciamento voluntário. Por “má memória”?
Este é um assunto que habitualmente dá origem às mais díspares (e muitas vezes disparatadas) reações e polémicas. Houve de tudo na Guerra Colonial mas, se quer que lhe diga com sinceridade, a maioria dos militares das Forças Armadas Portuguesas em Angola comportou-se como tropa de ocupação, com o correspondente cortejo de abusos e até de crimes, muitos deles incentivados pelos altos comandos militares, que queriam uma vitória a qualquer preço.
Quanto aos angolanos que cumpriram o serviço militar obrigatório no Exército Português (até o cantor Bonga passou pelas fileiras da tropa colonial), poderei dizer, a partir da minha limitada experiência pessoal, que tiveram um comportamento digno, o que só os honra. Este facto talvez explique, até certo ponto, a razão pela qual os movimentos de libertação, não só não os hostilizaram, mas quiseram mesmo atrai-los para as suas próprias fileiras. Tendo Angola ascendido à independência num ambiente de guerra civil, cada um dos movimentos beligerantes procurou atrair para si os antigos soldados do exército colonial, porque tinham experiência de combate. Enquanto na Guiné-Bissau os antigos comandos africanos foram em grande parte fuzilados pelo PAIGC e em Moçambique os moçambicanos que combateram a Frelimo foram rotulados de traidores e enviados para campos de reeducação, em Angola o MPLA, a FNLA e a UNITA esforçaram-se por aliciar os angolanos do antigo exército colonial a alistarem-se nas suas fileiras. Muitos fizeram-no, outros não. Os que não o fizeram não sofreram represálias por isso, tanto quanto sei.
O texto, aparentemente completo, do trabalho académico que cita está em https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/42481/1/A%20viol%C3%AAncia%20colonial%20no%20Portugal%20democr%C3%A1tico_mem%C3%B3rias,%20corpos%20e%20silenciamentos.pdf
Sim, é precisamente desse artigo que retirei o que cito. No meu entender, o silenciamento por parte de quem viveu os horrores da guerra é mais evidente nos que ficaram com stress pós-traumático. Mais nesses ex-soldados do que nos mutilados.
Não deixa de ser significativa a atividade de grupos de ex-colegas de tropa que tantos anos depois dos traumas mantém encontros, convívios e almoços. Alguns contam as memórias em blogues, como sabe. As ligações pessoais construídas naquele contexto tinham muito a ver com a perda da candidez da juventude. Mas o silenciamento mais geral na sociedade portuguesa sobre essa guerra é feito por todos, não só de quem regressou. Muitos dos que ficaram na “metrópole” - não só os que beneficiaram materialmente - se calam sobre o assunto. Por isso falo em “má memória” “incómoda”...
Mesmo assim, em rigor da verdade há motivações opostas para o silenciamento em causa. Por um lado, as famílias que ganharam “caixas de pinho” querem esquecer. Por outro lado, os poucos que adquiriram património habitacional graças a “proventos” de serviço preferem que se ocultem as fontes...
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